domingo, 10 de maio de 2020

O Palco do Terror

A cidade de Mersin, ao sul da Turquia,tem belezas naturais de tirar o fôlego. Por ser uma cidade, as margens do mar do mediterrâneo e também pelo imponente castelo de Korikos,uma construção medieval que fica as margens do mar. Mas de tirar realmente o fôlego é o que irei relatar aos leitores. Fato que me foi descrito por pessoa que não posso nomear neste registro, mas tem de mim toda credibilidade desejável. Mesmo sendo algo que se possa atribuir a alguém da mais astuciosa imaginação, jazem a miúde em recantos secretos do pensamento, inacessíveis a compreensão humana. Porem devo dizer que tudo o que vivenciamos é real, ao seu modo. Acontecimentos naturais e inevitáveis exageros em que caímos quando relatamos situações cuja influência foi forte e ativa sobre as faculdades da imaginação. Alem do fato de os incidentes a narrar serem de uma natureza tão fantástica, não tendo, necessariamente, outro apoio senão eles próprios. Era maio de 1861, e Mersin sendo uma cidade ainda pequena, estava naquele período em plena primavera, se via agitada pela presença do circo dos irmãos Kolberts, artista andarilhos de viajavam por todo país, e que carregavam a fama de levarem ao locais em que passavam grandes espetáculos. Entre as diversas atrações, um ilusionista chamado Dhed tinha lotação total em sua tenda durante suas apresentações, usando uma capa de cor avermelhada e sempre acompanhado de sua assistente, a quem ele intitulava ser Norma, a esposa do deus Osíris. Em seu belíssimo palco, durante suas exibições, era colocado sobre uma pequena mesa uma diminuta estatueta de pedra, que segundo o artista,daria origem ao seu nome. Era uma simbologia bastante comum e encontrada na mitologia egípcia. Um hieróglifo em forma de pilar que representa estabilidade. Os antigos assoviavam a imagem ao deus Osíris, o deus egípcio do pós-morte, do submundo e daqueles que vivem em travas. A sua representação assemelha-se a uma coluna vertebral. O pilar de Dhed foi também utilizado como para os vivos e mortos, para a invocação de almas perdidas que perambulam pela terra. O místico mestre das ilusões encantava a todos com seus inúmeros truques. Entre os mais esperados pelo público, além de espelhos, fumaça, espadas e o brilho das pedrarias de sua capa, estava a façanha de fazer desaparecer objetos e reaparecerem em outros. Os brilhantes espetáculos se seguiram por doze noites, e após terminar sua última apresentação, Dhed notou que nem todos os expectadores deixaram sua tenda. Cinco homens permaneciam sentados em suas cadeiras na primeira fila. ---Senhores...o show já terminou. Disse o ilusionista. Um indivíduo bem vestido e aparentando mais de cinquenta anos, com um vasto bigode grisalho, ergueu-se de sua cadeira e aproximou-se do palco, enquanto os demais permaneceram sentados, observando enquanto o mágico recolhia seus objetos. ---Sr. Dhed, creio que na sua última passagem pela cidade de Antalia, uma grande quantia em joias desapareceram do Antalia Bank, como em um passe de mágica. O artista nem por um instante mostrou-se abalado pela acusação do estranho expectador. – O que eu faço são truques de mágica, não roubo bancos senhores! É mera ilusão, que somente seus olhos podem torná-las reais. Seja o que foi que os senhores imaginaram, não passa de ilusão. Aquela explicação absurda, de um cinismo incrível, deixou a todos estarrecidos. Encontravam-se todos diante de uma situação no mínimo intrigante, na qual o acusado fundamentava sua inocência de modo quase inacreditável, sem cabimento algum, zombando da situação. Fazendo o que sabia fazer de melhor, iludir. O homem de pé enfrente ao palco, abriu levemente seu paletó mostrando preso em seu colete o emblema de metal da polícia Turca. – Sou o inspetor Mallet, e creio que o senhor deve me acompanhar, juntamente com a moça a qual chama de esposa de Osíris. Precisamos de uma explicação,mas na delegacia. Mesmo com o que disse o inspetor, Dhed permanecia extremamente calmo. ---Prezado inspetor,nada possuo a não ser minhas roupas e minha tenda. Como poderia eu,possuir joias de grande valor e viver miseravelmente neste circo ? – Tenho acompanhado suas apresentações. Disse o inspetor. E continuou ---Parece-me que infelizmente em cada cidade que o senhor passa, misteriosamente objetos valiosos desaparecem sem deixar vestígios, sem nenhuma pista. Já revistamos sua carruagem e encontramos algumas peças lá. Desta vez o senhor não vai escapar. O ilusionista mantendo a mesma serenidade, agachou-se no palco para ficar mais próximo a Mallet. ---Existem dias senhor inspetor, em que gostaríamos de voltar e começar tudo de novo inspetor, mudar nossa maneira de viver, mas quem poderia afirmar que se pudéssemos começar de novo não terminaria da mesma forma. Poderíamos dizer que é o destino. O inspetor é um homem justo, por este motivo não vai negar-me um último pedido antes de conduzir-me a delegacia. Gostaria de fazer minha última apresentação, um único número, e somente para os senhores. Houve uma breve hesitação por parte do policial, mas recuando até sua cadeira fez um aceno com a mão sinalizando que concederá sua derradeira solicitação, e sentou-se novamente ao lado dos demais policiais. ---Cuidado com o que vai fazer Dhed, desta vez estamos preparados. Será que vai fazer-nos desaparecer também? A observação do inspetor causou risos aos demais policiais. ---Que mágica poderia eu fazer para fugir dos senhores? acho que somos livres para sermos, bons, maus ou indiferentes. Penso que o caráter determina o destino, porem não creio que o resto é predeterminado. É apenas consequência de nosso atos. Após terminarmos o número estaremos aqui mesmos, a sua espera inspetor. Com esta resposta, o homem das ilusões colocou sua auxiliar de joelhos no palco, e pegando um sabre que estava sobre a mesa colocou a lâmina na parte frontal do pescoço da moça. – Devo alertá-los que é apenas um truque, jamais teria eu a intenção de ferir minha tão linda assistente. Dizendo isto, o ilusionista com um rápido e certeiro movimento atravessou de um lado ao outro o pescoço da jovem com a afiada lâmina do sabre. Um silêncio mortal caiu sobre a tenda. Até que segurando a mão da jovem, ajudou-a a levantar-se e com um breve movimento de reverência agradeceram a minúscula plateia de policiais que os assistia. Era com certeza o melhor e mais difícil número de ilusionismos já feito, mas para o desencanto de Dhed, das mãos de seus expectadores nenhum aplauso ouviu-se, permaneciam sentados, imóveis, com suas gargantas cortadas e suas cabeças jogadas ao chão.

O Homem e seu tempo

Lúcio Aneu Séneca, um dos mais célebres filósofos estoicos do Império Romano, escreveu em sua obra ``A brevidade da vida´´ que o homem de...