quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Adeus Aurora

Havia um profundo silêncio na pequena casa onde morávamos, no distrito de Mont Vermon, e pela longa noite havia eu, permanecido quase imóvel, sentado ao lado do leito onde minha amada Aurora repousava. Por longos momentos, levei-me a recordar indescritíveis momentos junto com a mulher que amo. Pois não havia felicidade maior que estar ao lado deste anjo que foi colocado em meu caminho para consolar-me quando das angústias do fracasso. Seus cabelos, que até então eram a seda mais pura, agora já estavam emaranhados e alguns fios se precipitavam pelo rosto, presos pelo suor que a infame moléstia havia trazido ao meu grande amor. Sua face tão bela como uma linda boneca de louça, já aparentava uma imagem cadavérica, seus lindos olhos castanhos já envoltos em profundas olheiras escuras prenunciavam amargamente que o fim estaria próximo. Por momentos fixei minha atenção na tela pintada a óleo que estava pendura sobre a cama, era um presente de seu pai, Vicent Renoir, Aurora tinha um carinho especial por esta pintura, pois nela seu pai retratara sua mãe Lise, de quem ela sentia imensa saudade. Lembro-me que na última vez em estive na presença de Vicent, ele disse-me não temer a morte e acrescentou. -A glória da vida supera o medo da morte. Talvez minha enferma esposa não compartilhe do mesmo pensamento, haja visto o sofrimento que a doença lhe trouxera, ceifando-lhe a vida aos seus vinte e três anos. Mesmo sem saber se minhas palavras podiam ser por ela ouvidas, peço-lhe perdão por não poder tirá-la deste sofrimento, sei que somente Deus tem o poder de perdoar, por isto roguei ao todo poderoso que por alguns instantes, possa aquele anjo de candura com o qual casei-me, perdoar-me e seguir para um local onde o sofrimento não mais exista. A vida com suas angústias e sofrimentos, é irremediavelmente nossa, e por este motivo cabe a nós, e tão somente a nós,suportá-la. Por alguns instantes me vi envolto em lembranças, nosso primeiro encontro, quando da inauguração do teatro Bataclã, por convite de nosso amigo Charles Dickens, assistimos a peça intitulada ‘Óliver Twist’.Lembro-me que Dickens ficou por deveras impressionado com a beleza de Aurora. O sorriso de minha amada irradiava um frescor de juventude, seus graciosos movimentos a todos encantava. Era o início dos melhores dias de minha vida, ao lado da mulher que foi sempre minha fonte inspiradora em meus contos. Já doente, em um dos poucos momentos de lucidez, disse-me ela. -Se algum dia minha alma mortal partir, algo permanecerá, eu permanecerei em teu coração. Houve um tempo em que a relva, a fonte,o rio, a mata e o horizonte se vestiam de uma luz grata, ou assim me parecia, na opulência que em nossos sonhos é inata. Sendo hoje tudo novo, uma realidade dolorosa, pois na luz ou no breu, não verei jamais quem tanto amo. Mas na planície de minha alma uma bela flor ainda existirá, amenizando a infinda lembrança  de uma intensa paixão. Seu corpo não mais se move, suas pequenas e gélidas mãos não mais seguravam as minhas, seus lindos olhos como se esculpidos a mão paralisaram-se, eu sábia, era inevitável. Sempre estarás viva em meu coração, adeus meu eterno amor.

O Homem e seu tempo

Lúcio Aneu Séneca, um dos mais célebres filósofos estoicos do Império Romano, escreveu em sua obra ``A brevidade da vida´´ que o homem de...