sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Pequenos Espíritos

Oslo – Noruega – 1861 - Permaneci no mesmo lugar, imóvel,ainda que minha vida dependesse de uma única palavra, eu não teria conseguido pronunciá-la. Estava perplexo. Um acontecimento horrível e indescritível, beirando o inacreditável. Naquele momento os pássaros certamente se recusaram a cantar e a temperatura caiu repentinamente, como se o próprio Deus tivesse sem fôlego com o que via. Ninguém naquele lugar se atrevia a falar em voz alta, tanto pelo espanto ou simplesmente por lamentação. Aos poucos foram retirando os pequenos corpos, um a um a medida que os escombros eram removidos, e pequenas mãos e pernas ainda podiam ser vistos. Mas já sem vida. Em vão, o meu cérebro inventava os mais absurdos expedientes para conseguir manter-me lúcido, expedientes análogos aos que um homem mergulhado no sono tremulo do medo teria imaginado para uma cena tão assustadora. Os olhos das crianças mortas estavam fechados, como se esperassem permissão para abri-los, ou talvez para não presenciarem seu próprio fim. Ainda era como se estivessem ainda sonhando com sorvetes, pular corda, brincar de bonecas, ou alguma outra coisa que pudesse trazer-lhes alguma alegria. E nada além de esperar amanhecer para correr na rua e brincar. Nunca, por mais que eu viva, poderei esquecer a intensa agonia de terror que senti naquele momento. Arrepiaram-se os cabelos, senti o sangue gelar-me nas veias, o meu coração quase deixou de bater ,agachei-me e Ajoelhado junto aos pedaços destroçados do orfanato Akersveien que se espalhavam pela rua, permaneci imóvel, paralisado pelo imenso pavor e tristeza daquele momento. Será que suas inocências foram levadas junto com suas vidas? Soterradas na terra fria? Inocentes com destinos extremamente cruéis. Porque Deus permite tais atrocidades? Terá a maldade o poder de surpreender até o próprio Deus? Será que voltarão, felizes e novamente inocentes, em outras vidas? Eu quero acreditar muito em uma verdade que esta além da nossa própria, que esta oculta, escondida de tudo, exceto dos mais sensíveis olhos. No interminável processo das almas, que não pode e não será destruído. Eu quero crer que ainda não temos o pleno conhecimento da eterna recompensa de Deus, e também de suas tristezas. Penso que ainda não conseguimos ver claramente a verdade dele. Mas acredito que a inocência que nasce ainda vive, e não some na terra fria. Apenas espera para surgir novamente, na contemplação de Deus, no mesmo ou em outro local, para que os pequenos olhos possam em fim abrirem-se.

O Homem e seu tempo

Lúcio Aneu Séneca, um dos mais célebres filósofos estoicos do Império Romano, escreveu em sua obra ``A brevidade da vida´´ que o homem de...