segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

As Moedas do Rei Eledur

Pessoa alguma que me conheça colocará dúvida que para executar essa missão que me impus, eu não desenvolva todo o talento de que disponho com a rígida imparcialidade, o escrupuloso testemunho que habitualmente se exigem daquele que deseja ganhar os louros de historiador. Pois este reconhecimento pouco me é desejado, Porem quero em meu relato, mostrar minha visão do acontecido. Em um Local muito distante daqui,existia um rei chamado Eledur, seu reinado era com braço de ferro e com tamanha crueldade, que enquanto seu povo penava por fome e péssimas condições de vida, seu reino era de soberba e luxo. Seu povo deveria todo mês lhe entregar tributos no palácio, sob pena de serem levados as masmorras se nada lhe fosse entregue. Neste mesmo palácio morava Farfan, o bobo da corte, homenzinho de apenas um metro e vinte centímetros  de altura, que com sua roupa multicolorida, seu chapéu de cinco pontas e seus sapatos de tecido com longos bicos, trazia entretenimento ao rei e sua débil corte de beberrões. Farfan fora levado ao palácio quando tinha apenas 5 anos, retirado da tenda de uma trupe de anões atuadores que passava pelo povoado, seus pais não tiveram escolha, pois seria deixar o menino ou assistirem sua morte pela mão do próprio rei. O pequeno palhaço, com suas curtas pernas arqueadas, não tinha motivos para admirar seu rei, e com imensa tristeza aguardava o momento de poder por fim aquela vida de humilhação e desonra. Certa noite, sentado em uma das pilastras do palácio, enquanto costurava os retalhos com os quais fazia suas vestes, Farfan viu passar dois guardas palacianos com uma enorme sacola de couro, extremamente pesada, acompanhados pelo rei, e depositaram a sua carga nos aposentos reais e voltaram todos para o salão. Naquela noite havia uma grande festa e todos os seus conselheiros e nobres amigos do soberano se regozijavam do melhor vinho e de belas mulheres que vendiam seus carinhos por comida e míseras moedas. O maquiavélico pequenino não pensou duas vezes, adentrou ao quarto real e foi direto averiguar a pesada carga, seus pequenos olhos brilharam ao contemplar tamanha quantidade de moedas de ouro, seria o suficiente para viver o resto de sua vida sem precisar mendigar favores de um rei tirano, e quem sabe até reencontrar sua família. Tirando rapidamente seu gorro de cinco pontas da cabeça, tratou de enchê-lo com algumas moedas e furtivamente, pelos escuros corredores do gigantesco palácio, correu, se é que posso assim definir, até a torre do Sino na praça central do povoado. Esta torre tinha,aproximadamente 30 metros de altura, nela existia quatro lados, cada um dos lados tinha um antigo relógio, todos perfeitamente funcionando, porem o mais assombroso é que cada um dos sete relógios marcava um horário diferente. Fato este, que devo admitir, era um tanto quanto curioso, e até mesmo um pouco perturbador. Aproveitando o desenrolar da grande festa palaciana, Farfan fez incontáveis idas e vindas a torre, até ver concluído seu intento por completo, deixando totalmente vazia a sacola do tão desejado tesouro. Já preparava-se Farfan para deixar a torre antes que sua falta fosse sentida pelo malvado rei, quando escutou passos na escada que levava a torre, imediatamente olhou em direção a pequena porta do campanário e o que viu o fez gelar até os ossos. Parado em sua frente, alguém exatamente como ele, sua própria imagem, parecia ao confuso anão que estava a ver-se em um enorme espelho. Os pequenos olhos arregalados e as tremulas e tortuosas pernas demonstravam quão perplexo ficou o  ladrãozinho real . Aquela diabólica imagem se aproximou, e falou sussurrando ao assustado e paralisado ouvinte:  – O que fizeste não esta  certo, devolva o que não lhe pertence. Sem saber o porquê, sem mesmo entender o que estava acontecendo, Farfan respondeu; – Ele já tem muito, e eu fui muito humilhado, esta é minha passagem para liberdade. Respondeu ele, sentindo-se como um insano a falar com a própria imagem.. – Sua família teria vergonha de você. Disse o estranho visitante, enquanto pulava como um macaco ao redor do monte de moedas. – Mas que é você? Perguntou ainda confuso Farfan. --Sou você mesmo, seu idiota, sua  consciência, o íntimo do seu ser. Respondeu o intruso. – Ainda tem tempo, devolva o que roubou e ninguém ficará sabendo. Completou o estranho homenzinho. Farfan pensou delirar, tinha que fazer algo, e rápido --isto só pode ser coisa da minha mente. Pensou o bobo larápio. Chegou então bem próximo a sua própria imagem, pois era ainda incrédulo do que se passava naquela velha torre. Se olharmos com muita convicção, veremos qualquer coisa que estivermos procurando, seja ela o que for, mas para que isto possa acontecer, teremos que ignorar uma infinidade de outras coisas, e uma destas coisas pode ser a verdadeira resposta, mas a ignoramos. Mas para ele não havia outra realidade, aquilo não podia estar acontecendo, era loucura. Talvez não seja real, seja um pesadelo diabolicamente vivido em plena lucidez. Mas a maldade do palhaço real iria muito além. Dizem que não morremos quando estamos sonhando, que nossa alma é imortal, e ele estava a ponto de comprovar a veracidade desta tese. Instintivamente Farfan, jogando-se sobre seu terrível algoz, empurrou o seu inimigo espiritual da alta torre do sino, mas enquanto fazia isto, o pequenino homem sentiu esvaírem-se suas forças, e um breu, como a mais escura nuvem do fundo das trevas cobriu por completo sua visão, sentiu então a terrível dor de seus ossos partindo-se em pedaços, sua respiração aos poucos foi ficando mais escassa.   Naquela mesma  manhã, após o final da grande festa palaciana, o rei foi comunicado pelo capitão de sua guarda, que o bobo da corte havia caído da torre do relógio, que ele havia salvado o tesouro que estava sendo roubado, Farfan estava morto, e as moedas de ouro no sino do campanário.   

O Homem e seu tempo

Lúcio Aneu Séneca, um dos mais célebres filósofos estoicos do Império Romano, escreveu em sua obra ``A brevidade da vida´´ que o homem de...