segunda-feira, 23 de março de 2015

Nove Minutos

O relógio pendurado a parede do solitário local, mostra que são vinte horas e cinquenta e um minutos, sozinho, aguardo na sala de espera do consultório do Dr. Richmon, meu psicanalista. Faltam apenas nove minutos para sentar-me em seu divã, e deixá-lo tentar desvendar em minha mente, coisas que nem eu posso afirmar serem reais. Devo dizer que, o que aqui escrevo, enquanto aguardo o momento da minha consulta, são pontos de vista aos quais estou plenamente convencido, mas em nenhum momento busco convencer. Já se passaram dois anos da minha primeira visita ao Dr. Richmon, e posso afirmar que neste período, deparei-me com interrogações nas profundezas de meu âmago, que até então estiveram incógnitas. Certo é, que somos manipulados diariamente por nossas próprias mentes, meros fantoches inconscientes, ou até mesmos conscientes, sonâmbulos despertos a perambular a mercê de nossos desejos, pois no fundo de nossa consciência, existem coisas que ocultamos até de nós mesmos. O princípio do inconsciente na psicanálise dá a oportunidade de explorar um território de incógnitas e mistérios, dentro de nós mesmos. Porem é lancinante percorrer uma trilha de reminiscências que compilamos durante os anos. Se torna penoso demais reviver aquilo que nos deixa triste. Mas como podemos coadjuvar situações com aqueles que buscam em nós elucidações de seus mais profundos sentimentos, quando, ás vezes, não conhecemos o nosso verdadeiro íntimo. Como elucidar desconsolos e ansiedades de quem procura deslindar seus infortúnios, se acobertamos no sumidouro de nossa alma, secretos e nebulosos sentimentos. Torna-se muito inteligível ao psicanalista identificar um enigma, quando ele provem de um processo ordenado, de uma racionalidade previsível. Mas como estabelecer alguma coerência, quando a causa e consequência estão em meio ao caos, envolto em espessa nuvem de temores e ressentimentos. Para isto, creio eu, busca o psicanalista elucidações através do grau de  inteligência congênita, e capacidade colaborativa do paciente, mas como exercitar esta inteligência nata, se não sabemos ao certo de onde ela vem. Os Egípcios pensavam que a inteligência ficava no coração, depois Platão rebateu afirmando que o cérebro era a parte inteligente e racional da alma, Aristóteles concluiu, dizendo que o coração é o centro da nossa inteligência, e que o cérebro servia apenas emissor de sentimento. Como disse anteriormente, de algumas coisas estou completamente convencido, mas não tento a ninguém convencer. E uma delas, é que neste exato momento, nesta massa cinzenta que tenho dentro de minha cabeça, uma tempestade elétrica gera um movimento caótico de sinais em meus neurônios, isto produz pensamentos, e neste magnífico momento, surge o que chamamos de inteligência. Durante nossa existência terrena buscamos a felicidade plena, mas a infelicidade tem o dom de multiplicar-se vertiginosamente, e com isto a incerteza se alastra rapidamente, espraiando-se por completo em nossa alma, este fato nos leva, muitas vezes, a pensar que ser infeliz é muitíssimo normal, aceitamos o mal como parte incrustada em nosso ser. Mas o gênero humano nos diz que o mal é a consequência do bem, pressupomos então, que o pesar nasce do júbilo, ou seja, como já escrevi em outra ocasião, a mão que afaga é a mesma que fere. Não seria exagero pensarmos que a alegria do passado, é a origem pura e simples das angustias vividas no presente. Quando estamos solitários, circundados por nossas efêmeras certezas, assumimos o papel de ouvinte e orador, a questionar a nós mesmos, sobre circunstancias que não ousamos falar, e negamos veementemente existir, apesar de estarem elas enraizadas dentro de nós. É deveras necessário passarmos por esta intrínseca autoanálise. Pois a única maneira de entender as aflições alheias é primeiramente conhecermos a fundo nossas próprias perturbações. Encoberto em nosso subconsciente existem disfarces quase imperceptíveis, nossas máscaras invisíveis, que a cada cenário assumem um papel diferente. Mas nenhuma máscara é tão terrivelmente perigosa quanto a da virtude, pois ela tem a chave para expor todos os nossos mais íntimos conflitos. Uma linha tênue e impalpável é a ligação entre quem fala, e aquele,que por consequência, deveria ouvir e analisar, o envolvimento entre as duas partes deve ser profundamente cuidadoso. Sem perceber, perdemos o foco no objetivo em si, para adentrar em um emaranhado de deduções por nós provocadas, até que ao fim do desnorteado devaneio, perdeu-se por completo o estimulo para buscar a causa principal, que fica esquecida por completo. Nossa consciência, ou razão, ou como o leitor assim descrever, assemelha-se aos penhascos oceânicos, citados na obra de Ptolomeu, que resistem bravamente a violência humana, a fúria dos ventos e dos mares, mas estremece suas bases ao toque de uma pequena criatura, chamada Abrótea. São agora, vinte horas e cinquenta e nove minutos, em instantes o dr Richmon vai abrir a pesada porta de madeira de sua sala, que eu denominei como sala dos segredos, e aos seus setenta e dois anos, com seu charuto entre os dentes, dizer com sua voz rouca e quase imperceptível.... ---Boa noite, pode entrar Sr. Lawford.

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